segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Metonímia

- A André Prosperi -


Faz frio, muito frio. E sol! Nem tanto sol. Os braços e os calos dos outros vão passando. Caminham pausadamente. Em alguma mente por aí está a mente de alguém. Um na mente do outro, um nas pernas do outro e no peito.
E passam os cabelos das pessoas diante de mim. Não são delas, são dele. Vêm os óculos de uma moça. São dele. Vêm os dedos de um rapaz. São dele.
É dele o coração de qualquer um que passe. O seu coração é todos mais o seu. O seu coração é inclusive o meu.
Em mim vão os trechos dele. Pedacinhos de gente que nele, só nele, são uma gente - e, ainda, todas as outras. Todos os tamanhos e cores de olhares, todos os dentes e pelos e peles. Aquilo que passar por mim terá um quê daquele todo.
Seja um cão alegre, meio malandro. Seja um gato gatuno. Seja uma mosca muito ágil, uma aranha cheia de olhos, uma pedra pensativa, uma folha em branco, um livro, uma música, um poema, o nome de meu irmão.
Sejam as roupas de um colega, o sabor do chá e do café, um par de chinelos. Cerveja. Vinho. Chocolate. Desordem pura, pura felicidade. Seja o meu joelho, a minha unha, as orelhas de uma amiga, um nariz de alguém. Tudo será ele, e tem sido. Decidido e imperativo.
A não ser a boca, que, como aquela, não há em parte alguma.

Um comentário:

  1. Que seja a autora o amor de minha vida é algo que torne, talvez, minha leitura tendenciosa. Mas ainda com o contrário suposto, admito minha paixão pelo que escreve.
    Seu texto me causa muitas coisas estranhas...

    ResponderExcluir